2009: crise do capitalismo generalizará e aprofundará a barbárie
Escrito por Valéria Nader (Correio da Cidadania)
05-Jan-2009
2009 inicia-se sem o costumeiro frescor característico dos anos novos. A explosão da crise financeira mundial em setembro de 2008, ainda que não tenha sido uma surpresa para economistas e analistas que acompanhavam a realidade com seriedade, deixou a todos estupefatos com a velocidade pela qual se propagou do epicentro da crise nos EUA para outros países centrais e emergentes. Em nosso país, encerrou-se precocemente nesse setembro um ciclo de crescimento de 4 anos, aproveitando-se de uma conjuntura internacional extremamente favorável e após longo período de taxas medíocres de evolução de nossa economia.
É enorme a quantidade de interrogações a respeito do que reserva este momento para as populações de todo o planeta, que iniciam o ano sob a angústia da incerteza quanto à duração e profundidade da mais severa crise econômica desde os anos 30 do século passado. Para discutir essa crise e os seus possíveis desdobramentos, o Correio da Cidadania entrevistou o historiador Mário Maestri.
Para ele, apesar de o Brasil ter conseguido crescer em outros momentos de crise profunda, como na 2ª Guerra, desta vez a história deve ser distinta. O país se equivoca ao apostar no mercado externo, em detrimento do interno, para evitar a anunciada retração econômica.
Mais do que nunca, o momento seria de retomar a consciência da classe trabalhadora no sentido de se recuperar a unidade perdida no passado, o que tanto a alienou. Porém, tal processo não encontra as melhores possibilidades dentro do Brasil, obrigando os movimentos e o proletariado a ficarem atentos ao perigo de se reafirmarem novas derrotas populares.
Crítico da esquerda, que parece cada vez mais capitular ao jogo institucional burguês, Maestri acredita que se "deve construir uma nova política, que favoreça a constituição do mundo do trabalho como sujeito social central", alertando que tempos de dureza para o povo não necessariamente alavancam revoluções populares e libertárias, como atestam diversos casos do século 20.
Correio da Cidadania: Em entrevista ao Correio da Cidadania em fins de 2007, você afirmava que a economia mundial avançava puxada fortemente pelo consumo dos EUA e da China, já sob o signo de uma próxima crise geral. Na sua opinião, a crise mundial que vivemos é apenas do modelo neoliberal ou do próprio capitalismo?
Mário Maestri: Em dezembro de 2007, lembrava que a expansão da economia brasileira se instalara tardiamente, em relação às nações ditas emergentes, devido à submissão do governo Lula da Silva ao capital financeiro. A economia brasileira incorporou-se, timidamente, apenas em 2006 ao grande boom expansivo geral de 2002. Em 2005, o PIB do Brasil empacava em 2,3%, para avançar timidamente, em 2006, para 3,7%, enquanto países como Argentina, China, Índia, Venezuela dobravam, havia anos, aquela taxa.
Naquele então, os membros e apologistas do governo neoliberal de Lula da Silva declaravam que o atraso da economia nacional em despegar devia-se à construção consciente de bases econômicas "sólidas" e "responsáveis" que garantiriam anos de expansão "auto-sustentada". E não à ditadura dos banqueiros e do pagamento incondicional da dívida.
Após o crescimento do PIB em 2007 em 5,4%, que deve se repetir em 2008, o Brasil se prepara para expansão entre 2 e 3% em 2009, deixando o altaneiro "vôo de águia" pomposamente anunciado pelo senhor Lula da Silva, em agosto, para retornar ao velho "vôo de galinha" espavorida, no melhor dos casos. Em verdade, começamos mal equipados nossa viagem ao coração da tempestade, que se afigura como crise geral da economia capitalista, e não mero solavanco neoliberal.
Em fins de 2007, lembrava que, ao contrário do dito pelos apologistas neoliberais, a situação estrutural do Brasil degringolava, com destaque para a desnacionalização da economia, que obriga à exportação crescente de lucros e dividendos; o enorme atraso da ciência nacional, que motiva sangria de divisas em royalties e compras de equipamentos e tecnologia; a atrofia do mercado interno e hipertrofia do externo, em momento de queda tendencial de preços e de volumes das exportações.
Fragilidade estrutural do país que se deve substancialmente à renúncia e impotência da burguesia brasileira em cumprir qualquer papel de defesa da nação, contente em se acomodar como súcubo do capital global. Isso em um contexto em que o mundo do trabalho não consegue se propor, mesmo programaticamente, como alternativa para a população brasileira, devido à sua fragilidade orgânica e subjetiva.
CC: Para ‘arrumar’ a economia mundial, economistas advogam medidas keynesianas, de regulação e disciplina dos gastos públicos. Outros descrêem de soluções "nacionais", vista a complexa trama de relações do sistema capitalista, controlado por conglomerados mundiais, imbricados ao Estado. É possível regulação da economia mundial? Está em curso algo do gênero?
MM: É patético escutar analistas, que há poucas semanas pregavam devotos a miraculosa capacidade de expansão eterna da acumulação de capitais. Não foram as medidas keynesianas que superaram a grande crise de 1930, mas a II Guerra, com a depressão, por longos anos, do valor do trabalho na Europa; com a destruição de inteiras ramas da produção; com a construção de uma nova hegemonia mundial e imensa acumulação nos EUA etc.
As medidas keynesianas defendem a expansão, e não a disciplina dos gastos públicos, para reativar a economia. O senado dos EUA rejeitou a ajuda às mega-empresas automobilísticas porque os operários se opunham a cortes dos salários, política depressiva, em contexto de regressão do consumo! O problema é a impossibilidade, na sociedade global, de se produzirem automóveis nos EUA, com salários superiores aos dos operários japoneses, brasileiros, chineses e, quem sabe, muito logo, haitianos!
Uma das grandes razões da amplitude da crise foi a enorme desregulamentação das práticas financeiras, bancárias, securitárias, acionárias etc., que pôs em circulação volumes fluviais de capitais, sem correspondência com a riqueza social. Esse ainda desconhecido magma de capitais ajudou a relançar setorialmente o consumo, com destaque para os EUA, e expandiu a produção, privilegiadamente na China, controlada por conglomerados mundiais.
Um arranjo que ensejou que o capital acumulado pela produção chinesa, consumida fortemente nos EUA devido à hegemonia e ao monopólio da moeda mundial, retornasse sobretudo como empréstimos a esse país, alavancando de lambuja a produção de commodities dos países emergentes, sob forte controle internacional, devido às necessidades produtivas do Dragão Asiático.
Uma expansão artificial do consumo que favoreceu o boom mundial de 2002-2008. No Brasil, a expansão artificial do consumo através do crédito, endividando a população, sustentou também o crescimento da produção dos dois últimos anos. A queda dessa pirâmide financeira-industrial vem sendo combatida por injeções astronômicas de capitais, para impedir quebradeira do sistema bancário-financeiro e, eventualmente, reanimar a produção já descolada da capacidade de consumo de população vergada por vinte anos de queda tendencial dos salários e desemprego. Queda dos salários que se pretende agora aprofundar nos EUA, no Brasil e no mundo, como solução da crise! Entre nós, o empresariado já propõe diminuição de horas de trabalho e de salários!
A desregulamentação não foi erro ou pecado da globalização; corrigido ou punido, ensejará nova e longa era de capitalismo mais regulado e civilizado, ainda que menos explosivamente rentável. O "outro mundo possível" dos que propõem o controle do neoliberalismo, no seio de uma ordem capitalista que defendem e sugerem como reformável e insuperável.
A desregulamentação foi a solução necessária encontrada pelo capitalismo para valorizar o capital. Ou seja, superar a inexorável queda tendencial da taxa média de lucro, devido ao crescimento do peso do capital morto [máquinas e meios de produção] e queda do capital vivo [trabalho], para valorizar o capital. O grande motivo das crises cíclicas de subconsumo, como lembrava o bom e velho Marx, em O capital, há bem mais de um século!
Terminada a enorme farra, começamos a viver a terrível ressaca. Os dois terços da produção da China voltados à exportação já recuam com a queda das encomendas globais, enquanto o terço orientado ao consumo interno inicia a deprimir-se, com as barbas dos chineses no molho! No seio das nações e entre as nações, já vivemos um "abandonem o barco" em que os mais fortes correm como sempre para os escaleres pisoteando velhos e crianças. Não há solução estrutural fora de reorganização racional da economia. Ou seja, à margem da expropriação e do planejamento social e democrático da grande produção, apenas possível em uma ordem socialista mundial.
CC: No Brasil, encerramos 2008 com crescimento econômico e maiores salários, queda do desemprego e inflação. Essa realidade vai recuar em 2009, com a crise financeira chegando à economia real? Ou estamos mais ‘blindados’ do que outros emergentes, como defende o presidente e seus ministros?
MM: Vamos pagar duramente pela submissão ao grande capital, especialmente financeiro. No momento expansivo, os altos juros transformaram o Brasil no paraíso da especulação, deprimindo o valor do dólar. Agora com a crise, conhecemos maxi-valorização! Com a mundialização dos preços, a queda dos valores das commodities vai se refletir apenas relativamente no Brasil, onde tudo que importamos encarecerá. A importação da inflação corroeria em um vap-vup os desmilingüidos ganhos dos salários dos últimos anos. E, novamente, espera-se conter a inflação importada com a depressão do consumo interno, com os mais altos juros do mundo, sobre os quais se acena para queda tendencial quando a crise estiver plenamente instalada! Política que fortalecerá a tendência já em curso de regressão do mercado do trabalho nacional.
CC: Qual a sua avaliação quanto à atuação do governo brasileiro diante dessa crise econômica global e de seus impactos na economia interna?
MM: Lula da Silva é patético e dramático. No ano passado, lembrava que seu problema não é ser inculto, como se assinala preconceituosamente, mas ser apenas esperto, pouco inteligente e, sobretudo, muito pretensioso. Já plenamente identificado ao neoliberalismo, convenceu-se de que a rápida expansão passada do país deveu-se a seu governo, vivendo a triste ilusão do simplório que crê reger com os movimentos dos braços a ida e a vinda inexorável das ondas do mar.
Em fins de março, dizia que a "crise não" chegara ao país e que o governo trabalhava com a "hipótese de que" jamais chegaria! Agora, com o bafo do bicho no gogó, promete com a mesma desfaçatez despachar a fera em breve lapso de tempo. Em jantar com a oficialidade, disse não acreditar que a crise dure além de 2009, até "porque nenhum presidente vai agüentar mais de um ano com a crise nas costas, gerando desemprego [...]". Portanto, os presidentes porão fim à crise para não perderem eleições!
O governo segue jogando a partida como se bastasse ficar empatado no segundo tempo para ganhar o jogo. Segue insistindo no incentivo e financiamento das exportações, em contexto de queda tendencial acelerada do consumo mundial. Parece contar com a violenta desvalorização do real, que empobrecerá a população, para apoiar as vendas no exterior. Promoveu uma enorme facilitação para o sistema bancário e sequer uma medida estrutural. Em verdade, gere os interesses pelos quais é responsável, despreocupado com o país e a população.
Entretanto, historicamente, o Brasil cresceu nas crises mundiais. Em 1914-18, em 1930-34, em 1939-45, o país avançou privilegiando o mercado interno, quando o externo não lhe podia nada oferecer. Essa política é ainda possível, devido ao caráter continental e à diversidade produtiva do Brasil. Porém, só será implementada apoiada em bloco social radicalmente diverso do que se encontra no poder e no governo. Ou seja, através de aliança social que tenha como eixo a moderna classe trabalhadora urbana, já que, hoje, uma política semelhante exigiria reestatização e forte ampliação da área pública privatizada; nacionalização do sistema bancário, do comércio exterior, da propriedade da terra; desenvolvimento da ciência e da tecnologia nacional; política de independência nacional, na diplomacia, na defesa etc.; garantia de trabalho para a população e crescimento sustentado e acelerado dos salários etc.
CC: Conhecendo-se as fragilidades estruturais [sociais, ambientais etc.] da sociedade brasileira, mascaradas pelos últimos avanços ainda que tímidos [da renda, emprego, crescimento], é possível que, de alguma forma, a crise contribua para que a população tenha uma consciência real do modelo econômico atual?
MM: É estranha a euforia de setores da esquerda com a crise. É quase como se ela viesse para confirmar as propostas do marxismo e, sobretudo, para nos tirar do buraco e isolamento em que nos encontramos, ao nos entregar, finalmente, de mão-beijada, a direção do movimento social e, quem sabe, dos destinos do país.
A crise de 1929 ensejou a vitória do nazismo na Alemanha, a consolidação do fascismo na Itália, do salazarismo em Portugal, do stalinismo na URSS, etc., em um momento em que o socialismo e a revolução proletária eram alternativas para imensas parcelas da população, não apenas trabalhadora. Como dito, a grande crise levou à II Guerra, com suas dezenas de milhões de mortos.
A crise atual já caUSA e vai caUSAr tristezas e sofrimentos indescritíveis para imensas parcelas da população, através do desemprego, pobreza, fome, angústia, doenças e, quem sabe, guerras locais e gerais, em possível dura disputa pela manutenção-conquista das posições hegemônicas, entre os principais núcleos capitalistas – EUA, China, Europa, Índia etc. – e destes com as nações periféricas.
Um processo de fortalecimento das contradições entre as nações, ensejado pela difícil situação do grande capital, que já acirra as fricções, na América do Sul, entre o governo Lula da Silva, em defesa do grande capital tupiniquim [Petrobrás, empreiteiras, Gerdau, Itaipu Bi-nacional, Vale etc.], e as nações argentina, boliviana, equatoriana, paraguaia etc.
Não há correlação necessária entre avanço da exploração e salto de consciência. Ainda que a crise fortaleça enormemente o confronto de classe, exigindo que os trabalhadores definam e implementem suas soluções políticas e sociais. Sobretudo no Brasil, onde a desorganização e a alienação do movimento social são grandes, onde não existe ainda organização política socialista de raízes operárias, impõe-se um forte esforço para que essa conjuntura não aprofunde a derrota da população trabalhadora. Para que, ao contrário, se fortaleça o mundo do trabalho como alternativa nacional.
CC: Mediante o caráter severo dessa crise, ela abre possibilidade de emergência de uma sociedade socialista no mundo e no Brasil? Há uma organização política e social efetiva das forças de esquerda de modo a conduzir à ruptura com o regime capitalista?
MM: Cada vez mais, a própria sorte da humanidade depende imperiosamente da superação socialista e revolucionária das contradições capitalistas. A própria destruição ambiental e as modificações climáticas ensejadas pela industrialização desenfreada já vergastam duramente a população do Globo, apontando para crises de crescente gravidade a curto e médio prazo. No Brasil, já vivemos em forma crescentemente dura as seqüelas dessa realidade, que associa crises climáticas, degradação ambiental, empobrecimento da população.
A depressão dos preços das matérias-primas ensejada pela crise está pondo e porá em cheque as propostas populistas e centristas de melhor distribuição dos recursos nacionais, sobretudo energéticos, para melhores condições populares de vida, sem superação da exploração mundial e nacional, como na Venezuela, Bolívia, Paraguai e Equador. O Equador já vive plenamente essa realidade.
Sem os recursos milionários ensejados pela valorização da energia, governos como os da Venezuela e Bolívia terão que optar, muito logo, entre superar suas vacilações ou reprimir a população ou entregar ingloriamente o governo à direita, legal ou ilegalmente. Se Hugo Chávez não avançar no sentido da plena expropriação do grande capital na Venezuela e construção de poder popular, transformar-se-á em uma nota ao pé da história, como o general peruano nacionalista Velasco Alvarado, nos anos 1968-75, já quase esquecido.
No mundo e no Brasil, urge construir programa alternativo para a crise e para a sociedade capitalista em estágio senil, capaz de ser compreendido e abraçado mais e mais pelas classes trabalhadoras e populares, na conformação de um forte bloco social capaz de defrontar e vergar o mundo do capital.
Além das contradições históricas e estruturais do Brasil, a grande dificuldade dessa construção deve-se certamente à derrota histórica conhecida pelo mundo do trabalho, com a vitória da contra-revolução capitalista, em fins dos anos 1980, que ensejou uma violenta e geral regressão da confiança na capacidade de organização da sociedade segundo os valores do mundo do trabalho. Ou seja, uma descrença geral na ordem revolucionária e socialista.
CC: E no Brasil, como essa crise encontra as forças políticas de esquerda, em termos de sua organização e possibilidade para, no mínimo, construir uma plataforma de medidas destinadas a defender as camadas mais pobres dos efeitos da crise?
MM: Muito mal. No Brasil, no contexto de enorme fragilidade política, ideológica e organizacional do mundo do trabalho, o espaço político da esquerda tende a ser ocupado por representantes e propostas de segmentos sociais sobretudo médios, que possuem apenas contradições não essenciais com a ordem capitalista. Mesmo quando eles se reivindicam do marxismo e do socialismo. Uma realidade que contribui para a depressão da situação em que vivemos.
A fragilidade da nossa esquerda constitui reflexo direto da debilidade do movimento social, com destaque para o grande operariado industrial. A chamada crise de direção é reflexo da debilidade de constituição do movimento social. Não temos e jamais tivemos pólo operário que se anteponha ao capital, mesmo programaticamente. Tivemos um esboço de construção desse pólo, em fins dos anos 1970, que resultou na formação do PT e da CUT tendencialmente socialistas e classistas. Movimento que se frustrou, entre outros motivos, devido à vitória da contra-revolução mundial, nos fins dos anos 1980, e ao longo do ciclo econômico depressivo nacional.
As últimas eleições mostraram o forte recuo do classismo e socialismo e avanço do oportunismo e eleitoralismo na esquerda, como bem avaliado no Correio da Cidadania. No Rio Grande do Sul, o MES, a maior tendência do PSOL, foi de pires na mão receber o mensalinho legal da Gerdau! O dramático é que a ação espúria não teve sanção eleitoral. A candidata do MES recebeu a maior votação majoritária do PSOL no Brasil. Portanto, o eleitorado de esquerda já considera um tal comportamento aceitável. Não há, assim, por que não aprofundá-lo!
A fragilidade da esquerda e a do movimento social alimentam-se reciprocamente, em uma terrível espiral descendente. É improvável conhecermos reversão próxima substancial dessa realidade sem ruptura paradigmática da relação social de forças, nacional ou mundial, em favor do mundo do trabalho. A esquerda socialista e classista deve se voltar para o favorecimento do surgimento-consolidação de um forte pólo de classe no Brasil. Portanto, deve abandonar a eterna ilusão da fácil conquista da afeição de um movimento social e popular que mal existe.
Temos que construir uma nova política estranha ao oportunismo já endêmico na esquerda, fixada obsessivamente na conquista de posições de representação nas universidades, nos sindicatos e, sobretudo, em avançar, a cada dois anos, no abocanhamento de mais alguns deputados, vereadores, prefeitos etc. Tudo para participar do farto banquete da administração do Estado capitalista. Temos que construir uma nova política que, como proposto, favoreça a constituição do mundo do trabalho como sujeito social central, processo indiscutivelmente inacabado entre nós.
Mário Maestri, 60, rio-grandense, é historiador. Participou da luta social e anti-ditatorial nos anos 1960; refugiou-se no Chile e na Bélgica nos anos 1970; integrou o PT, nos anos 1980; participou da fundação do PSOL nos anos 2000, do qual se desligou. E-mail: maestri@via-rs.netEste endereço de e-mail está protegido contra spam bots, pelo que o Javascript terá de estar activado para poder visualizar o endereço de email
Valéria Nader, economista, é editora do Correio da Cidadania.
Colaborou o jornalista Gabriel Brito.
Escrito por Valéria Nader (Correio da Cidadania)
05-Jan-2009
2009 inicia-se sem o costumeiro frescor característico dos anos novos. A explosão da crise financeira mundial em setembro de 2008, ainda que não tenha sido uma surpresa para economistas e analistas que acompanhavam a realidade com seriedade, deixou a todos estupefatos com a velocidade pela qual se propagou do epicentro da crise nos EUA para outros países centrais e emergentes. Em nosso país, encerrou-se precocemente nesse setembro um ciclo de crescimento de 4 anos, aproveitando-se de uma conjuntura internacional extremamente favorável e após longo período de taxas medíocres de evolução de nossa economia.
É enorme a quantidade de interrogações a respeito do que reserva este momento para as populações de todo o planeta, que iniciam o ano sob a angústia da incerteza quanto à duração e profundidade da mais severa crise econômica desde os anos 30 do século passado. Para discutir essa crise e os seus possíveis desdobramentos, o Correio da Cidadania entrevistou o historiador Mário Maestri.
Para ele, apesar de o Brasil ter conseguido crescer em outros momentos de crise profunda, como na 2ª Guerra, desta vez a história deve ser distinta. O país se equivoca ao apostar no mercado externo, em detrimento do interno, para evitar a anunciada retração econômica.
Mais do que nunca, o momento seria de retomar a consciência da classe trabalhadora no sentido de se recuperar a unidade perdida no passado, o que tanto a alienou. Porém, tal processo não encontra as melhores possibilidades dentro do Brasil, obrigando os movimentos e o proletariado a ficarem atentos ao perigo de se reafirmarem novas derrotas populares.
Crítico da esquerda, que parece cada vez mais capitular ao jogo institucional burguês, Maestri acredita que se "deve construir uma nova política, que favoreça a constituição do mundo do trabalho como sujeito social central", alertando que tempos de dureza para o povo não necessariamente alavancam revoluções populares e libertárias, como atestam diversos casos do século 20.
Correio da Cidadania: Em entrevista ao Correio da Cidadania em fins de 2007, você afirmava que a economia mundial avançava puxada fortemente pelo consumo dos EUA e da China, já sob o signo de uma próxima crise geral. Na sua opinião, a crise mundial que vivemos é apenas do modelo neoliberal ou do próprio capitalismo?
Mário Maestri: Em dezembro de 2007, lembrava que a expansão da economia brasileira se instalara tardiamente, em relação às nações ditas emergentes, devido à submissão do governo Lula da Silva ao capital financeiro. A economia brasileira incorporou-se, timidamente, apenas em 2006 ao grande boom expansivo geral de 2002. Em 2005, o PIB do Brasil empacava em 2,3%, para avançar timidamente, em 2006, para 3,7%, enquanto países como Argentina, China, Índia, Venezuela dobravam, havia anos, aquela taxa.
Naquele então, os membros e apologistas do governo neoliberal de Lula da Silva declaravam que o atraso da economia nacional em despegar devia-se à construção consciente de bases econômicas "sólidas" e "responsáveis" que garantiriam anos de expansão "auto-sustentada". E não à ditadura dos banqueiros e do pagamento incondicional da dívida.
Após o crescimento do PIB em 2007 em 5,4%, que deve se repetir em 2008, o Brasil se prepara para expansão entre 2 e 3% em 2009, deixando o altaneiro "vôo de águia" pomposamente anunciado pelo senhor Lula da Silva, em agosto, para retornar ao velho "vôo de galinha" espavorida, no melhor dos casos. Em verdade, começamos mal equipados nossa viagem ao coração da tempestade, que se afigura como crise geral da economia capitalista, e não mero solavanco neoliberal.
Em fins de 2007, lembrava que, ao contrário do dito pelos apologistas neoliberais, a situação estrutural do Brasil degringolava, com destaque para a desnacionalização da economia, que obriga à exportação crescente de lucros e dividendos; o enorme atraso da ciência nacional, que motiva sangria de divisas em royalties e compras de equipamentos e tecnologia; a atrofia do mercado interno e hipertrofia do externo, em momento de queda tendencial de preços e de volumes das exportações.
Fragilidade estrutural do país que se deve substancialmente à renúncia e impotência da burguesia brasileira em cumprir qualquer papel de defesa da nação, contente em se acomodar como súcubo do capital global. Isso em um contexto em que o mundo do trabalho não consegue se propor, mesmo programaticamente, como alternativa para a população brasileira, devido à sua fragilidade orgânica e subjetiva.
CC: Para ‘arrumar’ a economia mundial, economistas advogam medidas keynesianas, de regulação e disciplina dos gastos públicos. Outros descrêem de soluções "nacionais", vista a complexa trama de relações do sistema capitalista, controlado por conglomerados mundiais, imbricados ao Estado. É possível regulação da economia mundial? Está em curso algo do gênero?
MM: É patético escutar analistas, que há poucas semanas pregavam devotos a miraculosa capacidade de expansão eterna da acumulação de capitais. Não foram as medidas keynesianas que superaram a grande crise de 1930, mas a II Guerra, com a depressão, por longos anos, do valor do trabalho na Europa; com a destruição de inteiras ramas da produção; com a construção de uma nova hegemonia mundial e imensa acumulação nos EUA etc.
As medidas keynesianas defendem a expansão, e não a disciplina dos gastos públicos, para reativar a economia. O senado dos EUA rejeitou a ajuda às mega-empresas automobilísticas porque os operários se opunham a cortes dos salários, política depressiva, em contexto de regressão do consumo! O problema é a impossibilidade, na sociedade global, de se produzirem automóveis nos EUA, com salários superiores aos dos operários japoneses, brasileiros, chineses e, quem sabe, muito logo, haitianos!
Uma das grandes razões da amplitude da crise foi a enorme desregulamentação das práticas financeiras, bancárias, securitárias, acionárias etc., que pôs em circulação volumes fluviais de capitais, sem correspondência com a riqueza social. Esse ainda desconhecido magma de capitais ajudou a relançar setorialmente o consumo, com destaque para os EUA, e expandiu a produção, privilegiadamente na China, controlada por conglomerados mundiais.
Um arranjo que ensejou que o capital acumulado pela produção chinesa, consumida fortemente nos EUA devido à hegemonia e ao monopólio da moeda mundial, retornasse sobretudo como empréstimos a esse país, alavancando de lambuja a produção de commodities dos países emergentes, sob forte controle internacional, devido às necessidades produtivas do Dragão Asiático.
Uma expansão artificial do consumo que favoreceu o boom mundial de 2002-2008. No Brasil, a expansão artificial do consumo através do crédito, endividando a população, sustentou também o crescimento da produção dos dois últimos anos. A queda dessa pirâmide financeira-industrial vem sendo combatida por injeções astronômicas de capitais, para impedir quebradeira do sistema bancário-financeiro e, eventualmente, reanimar a produção já descolada da capacidade de consumo de população vergada por vinte anos de queda tendencial dos salários e desemprego. Queda dos salários que se pretende agora aprofundar nos EUA, no Brasil e no mundo, como solução da crise! Entre nós, o empresariado já propõe diminuição de horas de trabalho e de salários!
A desregulamentação não foi erro ou pecado da globalização; corrigido ou punido, ensejará nova e longa era de capitalismo mais regulado e civilizado, ainda que menos explosivamente rentável. O "outro mundo possível" dos que propõem o controle do neoliberalismo, no seio de uma ordem capitalista que defendem e sugerem como reformável e insuperável.
A desregulamentação foi a solução necessária encontrada pelo capitalismo para valorizar o capital. Ou seja, superar a inexorável queda tendencial da taxa média de lucro, devido ao crescimento do peso do capital morto [máquinas e meios de produção] e queda do capital vivo [trabalho], para valorizar o capital. O grande motivo das crises cíclicas de subconsumo, como lembrava o bom e velho Marx, em O capital, há bem mais de um século!
Terminada a enorme farra, começamos a viver a terrível ressaca. Os dois terços da produção da China voltados à exportação já recuam com a queda das encomendas globais, enquanto o terço orientado ao consumo interno inicia a deprimir-se, com as barbas dos chineses no molho! No seio das nações e entre as nações, já vivemos um "abandonem o barco" em que os mais fortes correm como sempre para os escaleres pisoteando velhos e crianças. Não há solução estrutural fora de reorganização racional da economia. Ou seja, à margem da expropriação e do planejamento social e democrático da grande produção, apenas possível em uma ordem socialista mundial.
CC: No Brasil, encerramos 2008 com crescimento econômico e maiores salários, queda do desemprego e inflação. Essa realidade vai recuar em 2009, com a crise financeira chegando à economia real? Ou estamos mais ‘blindados’ do que outros emergentes, como defende o presidente e seus ministros?
MM: Vamos pagar duramente pela submissão ao grande capital, especialmente financeiro. No momento expansivo, os altos juros transformaram o Brasil no paraíso da especulação, deprimindo o valor do dólar. Agora com a crise, conhecemos maxi-valorização! Com a mundialização dos preços, a queda dos valores das commodities vai se refletir apenas relativamente no Brasil, onde tudo que importamos encarecerá. A importação da inflação corroeria em um vap-vup os desmilingüidos ganhos dos salários dos últimos anos. E, novamente, espera-se conter a inflação importada com a depressão do consumo interno, com os mais altos juros do mundo, sobre os quais se acena para queda tendencial quando a crise estiver plenamente instalada! Política que fortalecerá a tendência já em curso de regressão do mercado do trabalho nacional.
CC: Qual a sua avaliação quanto à atuação do governo brasileiro diante dessa crise econômica global e de seus impactos na economia interna?
MM: Lula da Silva é patético e dramático. No ano passado, lembrava que seu problema não é ser inculto, como se assinala preconceituosamente, mas ser apenas esperto, pouco inteligente e, sobretudo, muito pretensioso. Já plenamente identificado ao neoliberalismo, convenceu-se de que a rápida expansão passada do país deveu-se a seu governo, vivendo a triste ilusão do simplório que crê reger com os movimentos dos braços a ida e a vinda inexorável das ondas do mar.
Em fins de março, dizia que a "crise não" chegara ao país e que o governo trabalhava com a "hipótese de que" jamais chegaria! Agora, com o bafo do bicho no gogó, promete com a mesma desfaçatez despachar a fera em breve lapso de tempo. Em jantar com a oficialidade, disse não acreditar que a crise dure além de 2009, até "porque nenhum presidente vai agüentar mais de um ano com a crise nas costas, gerando desemprego [...]". Portanto, os presidentes porão fim à crise para não perderem eleições!
O governo segue jogando a partida como se bastasse ficar empatado no segundo tempo para ganhar o jogo. Segue insistindo no incentivo e financiamento das exportações, em contexto de queda tendencial acelerada do consumo mundial. Parece contar com a violenta desvalorização do real, que empobrecerá a população, para apoiar as vendas no exterior. Promoveu uma enorme facilitação para o sistema bancário e sequer uma medida estrutural. Em verdade, gere os interesses pelos quais é responsável, despreocupado com o país e a população.
Entretanto, historicamente, o Brasil cresceu nas crises mundiais. Em 1914-18, em 1930-34, em 1939-45, o país avançou privilegiando o mercado interno, quando o externo não lhe podia nada oferecer. Essa política é ainda possível, devido ao caráter continental e à diversidade produtiva do Brasil. Porém, só será implementada apoiada em bloco social radicalmente diverso do que se encontra no poder e no governo. Ou seja, através de aliança social que tenha como eixo a moderna classe trabalhadora urbana, já que, hoje, uma política semelhante exigiria reestatização e forte ampliação da área pública privatizada; nacionalização do sistema bancário, do comércio exterior, da propriedade da terra; desenvolvimento da ciência e da tecnologia nacional; política de independência nacional, na diplomacia, na defesa etc.; garantia de trabalho para a população e crescimento sustentado e acelerado dos salários etc.
CC: Conhecendo-se as fragilidades estruturais [sociais, ambientais etc.] da sociedade brasileira, mascaradas pelos últimos avanços ainda que tímidos [da renda, emprego, crescimento], é possível que, de alguma forma, a crise contribua para que a população tenha uma consciência real do modelo econômico atual?
MM: É estranha a euforia de setores da esquerda com a crise. É quase como se ela viesse para confirmar as propostas do marxismo e, sobretudo, para nos tirar do buraco e isolamento em que nos encontramos, ao nos entregar, finalmente, de mão-beijada, a direção do movimento social e, quem sabe, dos destinos do país.
A crise de 1929 ensejou a vitória do nazismo na Alemanha, a consolidação do fascismo na Itália, do salazarismo em Portugal, do stalinismo na URSS, etc., em um momento em que o socialismo e a revolução proletária eram alternativas para imensas parcelas da população, não apenas trabalhadora. Como dito, a grande crise levou à II Guerra, com suas dezenas de milhões de mortos.
A crise atual já caUSA e vai caUSAr tristezas e sofrimentos indescritíveis para imensas parcelas da população, através do desemprego, pobreza, fome, angústia, doenças e, quem sabe, guerras locais e gerais, em possível dura disputa pela manutenção-conquista das posições hegemônicas, entre os principais núcleos capitalistas – EUA, China, Europa, Índia etc. – e destes com as nações periféricas.
Um processo de fortalecimento das contradições entre as nações, ensejado pela difícil situação do grande capital, que já acirra as fricções, na América do Sul, entre o governo Lula da Silva, em defesa do grande capital tupiniquim [Petrobrás, empreiteiras, Gerdau, Itaipu Bi-nacional, Vale etc.], e as nações argentina, boliviana, equatoriana, paraguaia etc.
Não há correlação necessária entre avanço da exploração e salto de consciência. Ainda que a crise fortaleça enormemente o confronto de classe, exigindo que os trabalhadores definam e implementem suas soluções políticas e sociais. Sobretudo no Brasil, onde a desorganização e a alienação do movimento social são grandes, onde não existe ainda organização política socialista de raízes operárias, impõe-se um forte esforço para que essa conjuntura não aprofunde a derrota da população trabalhadora. Para que, ao contrário, se fortaleça o mundo do trabalho como alternativa nacional.
CC: Mediante o caráter severo dessa crise, ela abre possibilidade de emergência de uma sociedade socialista no mundo e no Brasil? Há uma organização política e social efetiva das forças de esquerda de modo a conduzir à ruptura com o regime capitalista?
MM: Cada vez mais, a própria sorte da humanidade depende imperiosamente da superação socialista e revolucionária das contradições capitalistas. A própria destruição ambiental e as modificações climáticas ensejadas pela industrialização desenfreada já vergastam duramente a população do Globo, apontando para crises de crescente gravidade a curto e médio prazo. No Brasil, já vivemos em forma crescentemente dura as seqüelas dessa realidade, que associa crises climáticas, degradação ambiental, empobrecimento da população.
A depressão dos preços das matérias-primas ensejada pela crise está pondo e porá em cheque as propostas populistas e centristas de melhor distribuição dos recursos nacionais, sobretudo energéticos, para melhores condições populares de vida, sem superação da exploração mundial e nacional, como na Venezuela, Bolívia, Paraguai e Equador. O Equador já vive plenamente essa realidade.
Sem os recursos milionários ensejados pela valorização da energia, governos como os da Venezuela e Bolívia terão que optar, muito logo, entre superar suas vacilações ou reprimir a população ou entregar ingloriamente o governo à direita, legal ou ilegalmente. Se Hugo Chávez não avançar no sentido da plena expropriação do grande capital na Venezuela e construção de poder popular, transformar-se-á em uma nota ao pé da história, como o general peruano nacionalista Velasco Alvarado, nos anos 1968-75, já quase esquecido.
No mundo e no Brasil, urge construir programa alternativo para a crise e para a sociedade capitalista em estágio senil, capaz de ser compreendido e abraçado mais e mais pelas classes trabalhadoras e populares, na conformação de um forte bloco social capaz de defrontar e vergar o mundo do capital.
Além das contradições históricas e estruturais do Brasil, a grande dificuldade dessa construção deve-se certamente à derrota histórica conhecida pelo mundo do trabalho, com a vitória da contra-revolução capitalista, em fins dos anos 1980, que ensejou uma violenta e geral regressão da confiança na capacidade de organização da sociedade segundo os valores do mundo do trabalho. Ou seja, uma descrença geral na ordem revolucionária e socialista.
CC: E no Brasil, como essa crise encontra as forças políticas de esquerda, em termos de sua organização e possibilidade para, no mínimo, construir uma plataforma de medidas destinadas a defender as camadas mais pobres dos efeitos da crise?
MM: Muito mal. No Brasil, no contexto de enorme fragilidade política, ideológica e organizacional do mundo do trabalho, o espaço político da esquerda tende a ser ocupado por representantes e propostas de segmentos sociais sobretudo médios, que possuem apenas contradições não essenciais com a ordem capitalista. Mesmo quando eles se reivindicam do marxismo e do socialismo. Uma realidade que contribui para a depressão da situação em que vivemos.
A fragilidade da nossa esquerda constitui reflexo direto da debilidade do movimento social, com destaque para o grande operariado industrial. A chamada crise de direção é reflexo da debilidade de constituição do movimento social. Não temos e jamais tivemos pólo operário que se anteponha ao capital, mesmo programaticamente. Tivemos um esboço de construção desse pólo, em fins dos anos 1970, que resultou na formação do PT e da CUT tendencialmente socialistas e classistas. Movimento que se frustrou, entre outros motivos, devido à vitória da contra-revolução mundial, nos fins dos anos 1980, e ao longo do ciclo econômico depressivo nacional.
As últimas eleições mostraram o forte recuo do classismo e socialismo e avanço do oportunismo e eleitoralismo na esquerda, como bem avaliado no Correio da Cidadania. No Rio Grande do Sul, o MES, a maior tendência do PSOL, foi de pires na mão receber o mensalinho legal da Gerdau! O dramático é que a ação espúria não teve sanção eleitoral. A candidata do MES recebeu a maior votação majoritária do PSOL no Brasil. Portanto, o eleitorado de esquerda já considera um tal comportamento aceitável. Não há, assim, por que não aprofundá-lo!
A fragilidade da esquerda e a do movimento social alimentam-se reciprocamente, em uma terrível espiral descendente. É improvável conhecermos reversão próxima substancial dessa realidade sem ruptura paradigmática da relação social de forças, nacional ou mundial, em favor do mundo do trabalho. A esquerda socialista e classista deve se voltar para o favorecimento do surgimento-consolidação de um forte pólo de classe no Brasil. Portanto, deve abandonar a eterna ilusão da fácil conquista da afeição de um movimento social e popular que mal existe.
Temos que construir uma nova política estranha ao oportunismo já endêmico na esquerda, fixada obsessivamente na conquista de posições de representação nas universidades, nos sindicatos e, sobretudo, em avançar, a cada dois anos, no abocanhamento de mais alguns deputados, vereadores, prefeitos etc. Tudo para participar do farto banquete da administração do Estado capitalista. Temos que construir uma nova política que, como proposto, favoreça a constituição do mundo do trabalho como sujeito social central, processo indiscutivelmente inacabado entre nós.
Mário Maestri, 60, rio-grandense, é historiador. Participou da luta social e anti-ditatorial nos anos 1960; refugiou-se no Chile e na Bélgica nos anos 1970; integrou o PT, nos anos 1980; participou da fundação do PSOL nos anos 2000, do qual se desligou. E-mail: maestri@via-rs.netEste endereço de e-mail está protegido contra spam bots, pelo que o Javascript terá de estar activado para poder visualizar o endereço de email
Valéria Nader, economista, é editora do Correio da Cidadania.
Colaborou o jornalista Gabriel Brito.
Labels: Crise do Capitalismo, Esquerdas
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